sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Francês, flamengo, holandês, inglês e PORTUGUÊS

Declaração de amor
'Esta é uma declaração de amor; amo a língua portuguesa. Ela não é fácil. Não é maleável. E, como não foi profundamente trabalhada pelo pensamento, a sua tendência é a de não ter sutilezas e de reagir às vezes com um pontapé contra os que temerariamente ousam transformá-la numa linguagem de sentimento e alerteza. E de amor.
Às vezes ela reage diante de um pensamento mais complicado. Às vezes assusta com o imprevisível de uma frase. Eu gosto de manejá-la como gostava de estar montada num cavalo e guiá-lo pelas rédeas, às vezes lenatamente, às vezes a galope.
Se eu fosse muda, e também não pudesse escrever, e me perguntassem a que língua eu queria pertencer, eu diria: inglês, que é preciso e belo. Mas como não nasci muda e pude escrever, tornou-se absolutamente claro para mim que eu queria mesmo era escrever em português. Eu até queria não ter aprendido outras línguas: só para que a minha abordagem de português fosse virgem e límpida.
EU PENSO E SINTO SÓ EM PORTUGUÊS, e só esta língua penosa e terrível me satisfaria.
A linguagem está descobrindo o nosso pensamento, o nosso pensamento está formando uma língua que se chama literária e que eu chamo de LINGUAGEM DE VIDA.
Com as palavras a gente tem que tomar cuidado. No primeiro encontro nos libertam, depois nos aprisionam. Parecem-se com certo tipo de amor. As palavras, repito, têm caráter ambíguo, sendo veneno e remédio podem nos dar prisão ou libertar...
Viver é também arte de lidar com as palavras. E como já disse alguém: AS PALAVRAS SÃO CAMINHOS PARA ENCONTRAR AS COISAS PERDIDAS.'

Clarice Lispector

Lindo não? É por isso que eu escrevo.
Calma que ainda falta LONDRES!
Em português.

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