quarta-feira, 13 de julho de 2016

Alegria X Perrengue: o balanço da vida.

Nem tudo são flores. Havemos de convir que a vida é uma eterna solução de conflitos. Vivemos para resolver problemas. Matamos um leão por dia e treinamos para não sermos a última gazela do bando, caso o leão não tenha morrido. Contudo, ainda vale a pena quando é pelo menos 60% alegria e 40% perrengue. Como quando você vai subir a montanha em um dia lindo de inverno. É muito mais alegria, mas – claro – também tem uma pitada de perrengue. Fato. Aí chove. E te molha. E esfria. E inunda o caminho. E desmorona. O passeio que antes era 80x20 vira 20x80. Estragado está.

Quando a gente nasce, a vida é 100% alegria. A gente mama, dorme, faz xixi, come, faz cocô, dorme, todo mundo nos ama e nos protege e é só alegria.

Conforme vamos crescendo, esse balanço vai, ao poucos, invertendo-se proporcionalmente. Perto de um ano de idade, quando começamos a aprender o significado das palavras, começamos a entender a primeira frase desta publicação. Nem tudo são flores. Por que é que nos falam tanto ‘não’? Mas ainda contamos com uns 95% de alegria, pois somos fofos o suficiente para que não se aumente o perrengue. Porém, um tantinho mais que isso já provoca a necessidade dos nossos pais da rígida educação. Com dois ou três anos já temos que arrumar nossas bagunças. O que antes era uma fantasia, jogar tudo no chão e depois ir dormir, começa a dar lugar ao saquinho cheio da organização. 90x10.

Quando iniciamos a jornada estudantil é que o placar se altera drasticamente. Ir à escola, entender independência (aprender a se defender, fazer amiguinhos), lição de casa, enxugar os dedos dos pés e – o pior – acordar cedo fazem o placar da alegria deliberadamente despencar. 75x25. 5.ª Série/6.º ano, abaixa mais um pouco. 70x30.

Na adolescência esse placar sofre um severo revés, ratificado pela sensação hormonal de que a vida é uma merda. Por que afinal estamos aqui? Quem foi que teve essa ideia?? Chegamos a conviver com o perrengue como vencedor, com mais de 60%, certamente, porque ninguém nos entende e tampouco nos dá alguma resposta. Só a nossa BFF. E ainda temos que lavar a louça.

Passada essa fase, voltamos a andar na linha balanceada de 60-70 x 40-30, com algumas baixas, claro. Mas quando somos jovens acreditamos que o mundo é bom (há mais de 5000 anos que não é...), que as guerras e a violência gratuita vão acabar, que a corrução vai ser punida, que o Brasil vai crescer, que tudo vai dar certo, que vale a pena lutar. Uh!

Aí, chegamos à idade adulta e deixamos de lado alguns sonhos da juventude. Vamos aprendendo que pouco muda, principalmente neste nosso país, onde já passamos por muita coisa ruim que não serviu para nada. Nada. "A história se repete mas a força deixa a história mal contada." Ainda por cima, somos democraticamente obrigados a votar e perdemos o direito de entrar na cama elástica e na piscina de bolinhas. Crescer é perrengue garantido.

Aí a gente vai perdendo a fé. E percebendo que a vida, na verdade, é muito mais perrengue (60-70%) do que alegria (30-40%). Exceto por alguns “momentos felizes” em que voltamos a acreditar – enquanto durar o porrete – que a vida é bela. Aí a ressaca do dia seguinte devolve na sua cara uns 80% de perrengue da vida.

E a gente segue nessa luta. Balanceando. Buscando. Alimentando o que nos faz bem para que se viva pelo menos em um empate com a alegria.

Embora em nosso último suspiro a gente se encontre em 99% de perrengue (100 deve ser a morte), que por um milagre possamos recordar apenas das coisas boas e inverter naturalmente aquele instante, acreditando que tudo foi simplesmente bom.

(Se você discorda e acha que sua vida é 100% alegria, pare de tomar o remedinho e olhe para o lado. Não dá para ser mais de 50% feliz com mais de 50% da população mundial em 100% de perrengue.)

'I gotta tell you It gets better
every day you stay alive
and I'm amazed
every day that the sun decides to rise
every minute, every hour is another chance to change
LIFE IS BEAUTIFUL and TERRIBLE and STRANGE.'

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Sobre proteção, amor e sacudidas na cabeça. Para Liz.

O ciúme chega junto com o bebê mais novo, claro, principalmente para outro bebê de apenas dois anos, dois meses e quase vinte e dois dias, como costumamos dizer. Mas depois de um tempinho, a compreensão despercebida de que nascia ali uma parceria para toda a vida começa a tomar lugar naquele seu coraçãozinho ingênuo.

Eu tinha apenas poucas semanas de vida e chorava no berço, quando você tirou toda minha roupa e me pegou apenas segurando pelo meu pescoço – que era o que seus pequenos bracinhos conseguiam abraçar - deixando minhas perninhas balançando, quase tocando o chão frio da casa: - O neném tá chorando, mamãe! E a mãe desesperada, tentando não demonstrar para que você não se assustasse e me deixasse cair.

Depois, danada que você era, me tirava do berço à revelia da mãe, para brincar comigo na cama e me ensinar minhas primeiras palavras: ca-mi-o-ne-te. Acho que devo ter falado ‘mamãe’ primeiro, mas eu ria como gente grande, segundo relatos.

Esse coração mole aí me ensinava e me cuidava, enquanto este coração duro aqui retribuía em mordidas ferozes. Mas você era incapaz de revidar e machucar o neném. Desculpe-me por isso.

Ou não.

Os anos vão passando e a tomada de ciência do tamanho e de quem manda também uma hora chega. E então você se aproveitava disso quando começava a me inticar e me cutucar às escondidas, ou me convencer a fazer as coisas “primeiro”, pois eu acreditava que você também faria. Mas, na cara dura, você me deixava a lição implacável de nem sempre poder acreditar nas pessoas.

E quando na sua escola entravam mais cedo, você começava a descontar em mim suas angústias pré-adolescentes e me acordava quando saía para aula, com sacudidas e pancadas na cabeça. Aquilo é uma das piores lembranças que tenho da nossa infância, junto com os xingamentos horríveis porque eu não ia na bola da cortada sua ou do Tio Milico no vôlei. Claro que eu não ia. Eu sempre fui CDF, portanto esperta o bastante para saber que aquilo doeria. E eu ia embora chorando, mas ali percebia que eu ainda era uma criança e você já pensava em namorar. Danadinha.

Depois, quando novamente nos “igualamos”, fazíamos quase tudo juntas. Lembra de quando cortamos e pintamos o cabelo igualzinho para dizer para todo mundo que éramos gêmeas? E muitas pessoas acreditavam. E ficávamos conversando por horas antes de dormir, tentando entender as razões dessa vida. Guardando segredos, protegendo-nos mutuamente dos pais, dos meninos, do mundo.

Histórias são milhares, são ‘entas’ anos de irmandade, ratificando sempre esse elo que eu não tenho com mais ninguém. E apesar de sermos completamente diferentes, não há pudor, não há restrições, não há papas na língua entre nós. Nossa relação é aberta, direta, intensa e ao mesmo tempo tão easy goingrelax, divertida.


Hoje é seu aniversário e eu queria deixar registrado este amor único que tenho por você. O meu desejo mais forte é que você se cuide e tenha saúde para continuar comigo esta empreitada neste mundo louco, difícil e injusto, onde além de tudo já percebemos que somos uma para outra aquilo de mais precioso que ficou da nossa própria mãe, o que mais nos fortalece.

Feliz aniversário! Amo você!


sexta-feira, 27 de maio de 2016

Porque eles são chineses.

- Por que, Tai-pan?
- Porque eles são chineses.
- Não compreendo.
- Eu sei, rapaz. A primeira coisa que é preciso compreender: durante cinquenta séculos, os chineses vêm chamando a China de Império do Meio, a terra que os Deuses colocaram entre o céu, acima, e a terra, abaixo. Por definição, um chinês é um ser de superioridade sem igual. Todos eles acreditam que qualquer outra pessoa, qualquer, é um bárbaro e não deve ser levado em consideração. E que eles, sozinhos, como habitantes da única nação realmente civilizada, têm o direito divino de dominar a terra.
(...) 
E não desistirão até nos expulsarem.
- Por quê?
- Porque eles são chineses."
(Tai-Pan - James Clavell)

E então havíamos chegado em Beijing, já com um atraso de início, até então sem muitas explicações, mas imediatamente compreendido. Porque eles são chineses. Fizeram do jeito que quiseram, "eles nos pagam para dar consultoria e dizer o que fazer, mas quando os instruímos, não nos ouvem. E agora nós que temos que correr atrás do prejuízo, resolver os problemas para que tudo saia conforme o planejado."

Problemas nos materiais made in China, estruturas mal construídas, falta de engenharia e de alguns planejamentos. Trabalho consequentemente prejudicado.

No primeiro dia de chuva, a prova real de que a tenda não estava funcionando bem. Chovendo dentro, vento do Norte, e os chineses querendo que houvesse espetáculo de qualquer maneira.

Realmente tudo acontecendo da forma muito estranha. Normalmente os negócios são feitos por duas ou mais partes e devidamente respeitados, com algumas exceções, claro, mas conforme o acordo prévio. Mudanças e aditivos ou reduções durante o processo não costumam ser unilaterais, mas resolvidos e acertados por todas as partes envolvidas.

Mas percebemos que não é isso que está acontecendo. Apesar do encantamento com a sabedoria, com a organização, com a cultura milenar, o susto inesperado. Porque eles são chineses.

E de repente, um cancelamento da próxima cidade para ajustes da produção.

E de repente, um pedido inesperado de tempo, com o jogo já rolando.

E de repente, somos todos mandados de volta pra casa. Para retornar em um mês. Ou dois. Ou não. Vai saber. 

Porque, afinal, eles são chineses!

(Deve ser por isso que um dos maiores sábios deles se chama "Confucius" e a mão dele faz igual àquela vovozinha da propaganda do supermercado: 
- Eu quero é preço!!)


segunda-feira, 23 de maio de 2016

Parasitas assassinos


“Só porque um parasita não é um urso, tigre ou algum outro grande predador, isso não significa que ele não pode ser tão mortal. Às vezes, as menores criaturas acabam por serem os maiores monstros.”

Começou com uma dor de cabeça meio estranha. Algo que comi, pensei. Estar na China há poucas semanas e achar que vai passar incólume a todas as adaptações também é demais né. Ok, descansa um pouquinho, dorme um pouquinho, já passa. Transforma-se numa febre baixa. Sensação de febre é horrível, mas já sem dor de cabeça. Parasitas assassinos!!

Bendito Novalgina, importado do Brasil. Dá um suador da gota, mas é eficaz.

Segundo dia, a febre volta. Estranho.

Terceiro dia, a febre volta. Só febre. Nenhuma dor. Nenhum sintoma, nem tosse, nem nariz escorrendo. Nada. O medo começa a tomar conta da pessoa ocidental. Parasitas assassinos!! Quem manda assistir tanto Discovery?

Quarto dia, febre volta com dor nas costas irradiando para o braço esquerdo. Infarto? Mas não dói o peito! Pneumonia química? Mas não dói de respirar? Nem tosse. E a febre aumenta. Quatro dias deitada, claro que dei um mau jeito.

Quinto dia. Febre e com ela a mente ignorante seguida pelo doutor Google, mas sem muitas referências. Parasitas assassinos!!

Sexto dia, desisto do Novalgina. Malditos parasitas assassinos, agora é nóis, no mano a mano! Quero ver quem ganha. E mando-lhe meus leucócitos com toda força do mundo. Passo uma noite do cão, mas acordo sem febre.
 
Venci, penso feliz e vou passear. Ando 6 km (que ideia!) e volto pra casa com febre, claro. Encaro de novo e venço de novo. Ainda não sei o que vai acontecer, hoje é o sétimo dia, mas quando ficamos doentes a mente fragilizada prega peças absurdas e na minha, abençoada por certa criatividade, diagnostiquei-me com tudo. Mas minha conclusão PhD é de que é apenas uma virose chinesa, causada por algum parasita, mas que não é assassino. Espero que seja gente boa, como a maioria dos chineses que conheci aqui.

sábado, 14 de maio de 2016

A eterna busca



Sei que todos querem saber sobre a China e terei um ano para contar. Mas antes preciso falar sobre isso. A eterna busca pela felicidade, mas que tem a ver com meu momento China.

"Todo mundo quer encontrá-la"
Ano passado, quando voltamos de férias da Europa, assisti a um filme no avião chamado “Hector e a busca pela felicidade” (Original: Hector and the search for happiness”. Viva!! Não mudaram!), o qual recomendo fortemente, porque é excelente. No fim do filme eu chorava em bicas. Porque minhas férias tinham acabado, porque era uma comemoração de 40 anos, porque eu havia completado a meia-maratona de Amsterdam para a qual me preparei durante muito tempo, porque eu estava voltando para a realidade dura e sofrida do Brasil, porque meu trabalho não estava indo bem. Porque eu também queria muito encontrar a felicidade. Enfim. Bola pra frente. Eu já havia entendido a mensagem de Hector.

No inicio deste ano, resolvi fazer o curso de MT – MeditaçãoTranscendental – uma técnica (não é religioso, não é mandinga, não é fé. É uma técnica!) de repouso consciente que faz o cérebro se autocurar, ou seja, balancear todas as “inas”, boas e más, de forma natural. E com o início da meditação, este convite para vir à China.

Isso me fez lembrar e refletir sobre o Hector, a busca da felicidade e como tenho me comportado nos últimos anos.

Perdi a minha mãe muito cedo (2001), casei (2003), mudei de cidade (2005), perdi uma das minhas melhores amigas assassinada de forma brutal (2008) e sempre me posicionando perante a vida como forte, autossuficiente, independente. Uma hora foi por água abaixo. Chorei muito, sentia uma tristeza tão grande e sem motivo aparente que realmente me preocupei. Depressão diagnosticada (2010). Remédios, tarja preta, terapia, tudo que eu sempre detestei. Beleza, se não tem outro jeito, aceitei. Após este tratamento, que durou um ano, e alta do psiquiatra, fiquei mais molenga, mais chorona, mais frágil, pois senti na pele que tudo que não temos nessa vida é controle. E isso assusta! Mas nesse mesmo momento, a epifania: tudo bem, essa busca pela felicidade é realmente eterna. A satisfação plena é muito difícil e totalmente diferente do conformismo. Tem gente que lida bem com ele. Eu e o Hector não.

Poucos meses depois da alta do médico, iniciei a cinesioterapia (2011), queria algo diferente da linha freudiana. Minha terapeuta era (ainda é e indico, mas não faço mais) muito legal, ainda arteterapeuta, divertida e nosso bate-papo era ótimo e eficiente, enquanto durou. Tomei o Santo Daime, mas minha mente ultrafocada não me permitiu ver A luz. Também achei religioso demais. Valeu a experiência. Paralelamente, comecei a correr, coisa que nunca tinha pensado, mas que quando se consegue ultrapassar a barreira dos 5k confortáveis, sente-se a alegria máxima que aquela endorfina produz. Ótima para a felicidade!

E aí, uma amiga minha dos velhos tempos se suicidou (2013). Fiquei muito abalada, pois já havia sentido na pele a força de uma depressão. Parti para a terapia freudiana. A busca continua. Essa psicóloga me disse, dentre outras, uma coisa bem basiquinha, mas que me ajudou muito: procure fazer mais coisas das quais você goste.

Então me matriculei no sapateado (2014), vontade antiga que eu tinha. Minha felicidade já teve alguns auges e este foi um deles. Descobri que amo muito dançar e esta arte em especial é simplesmente demais! Dançar e tocar um instrumento ao mesmo tempo é muito genial!

Nesse ano também descobrimos o Kefir, um alimento “milagroso” descoberto no Cáucaso há mais de 3000 anos, com o qual se mantém uma relação simbiótica que faz bem para a gente e para o alimento, que é uma colônia de microrganismos cheia de probióticos e antibióticos naturais, e que faz um bem danado pra saúde. Mas tem que cuidar (por isso a simbiose) e se dedicar. Minha TPM melhorou em 80%! Tomamos até hoje.

Mas a busca continua e no início do ano passado (2015), conheci o ho’oponopono, também um método de autocura, baseado no amor através de palavras para chegar ao subconsciente, que é onde estão as memórias (que às vezes nem são nossas, estão em nosso DNA) e estas, muitas vezes, são obstáculos para os processos vitais. Dá-lhe ho’oponopono. Pratico sempre, não custa nada e o conforto vem imediatamente. E diz a descoberta que a partir do momento que você resolve estas questões com o mundo, ele se abre para novas e boas experiências!

E com toda a crise econômica que me pegou de cheio profissionalmente durante o ano passado, cheguei na MT (2016). Fiz o curso, medito diariamente e tudo que eu desejei e pedi ao universo vem se realizando. (Cuidado com o que você deseja, você pode ir parar na China!!) Mas não porque tenho sorte, ou ganhei na mega-sena. Até porque hoje percebo que talvez a crise que me afastou do meu trabalho e outras coisas que julguei problemas no passado foram, de fato, ótimas para o processo de crescimento como um todo. Mas principalmente porque nunca deixei de buscar. De me aperfeiçoar. De me tornar uma pessoa melhor.

Hoje agradeço, agradeço e agradeço. E continuo buscando.

E é isso que eu aprendi com o Hector e comigo mesma.

PS. Todos os links das minhas “maluquices” estão aí, para quem quiser compartilhar a eterna busca. Ou descubra suas próprias. Mas, por favor, não fique só reclamando da vida, que real e infelizmente não é fácil para ninguém. Faça alguma coisa.

sábado, 7 de maio de 2016

Ni hao!

O primeiro contato foi no aeroporto de Dubai. Já percebemos que o voo estava cheio. Quando a moça chamou para embarque os passageiros vip-top-masters e pessoas com necessidades especiais, todos os chineses foram pro gate. Quando ela chamou os da entrada A, todos os chineses foram pro gate. Quando ela chamou os da entrada B, todos os chineses já estavam no gate. C, D não sei pra quê. Quando chamou o E, que era o nosso, levantamos e percebemos o tamanho do pepino agridoce. Uma chinesinha minion parada na entrada da escada rolante gritando e tentando arrumar a bagunça, fazer a triagem para que o embarque se desse organizadamente. Doce ilusão, mas ela já devia saber. Nós é que ficamos chocados com aquela visão do inferno com olhos puxados. E rimos.

- Huanyíng Zhongguó! (Bem-vindo à China!) – disse o chinês da alfândega. Só que não. Mandou um cara-crachá-cara-crachá sem mover um pelinho da sobrancelha. Agora bem-vinda à China, pensei. Mas a oficial do raio X fez um gesto simpático para passarmos direto. Xièxie!

Sempre tive em mente que os orientais, principalmente chineses e japoneses eram sérios, fechados, na deles.

Quando saímos do desembarque, um chinês fofinho se aproximou e mandou um inglês-australiano impecável. Mentira! O menino morou cinco anos na Austrália e ainda assim é muito difícil entender o que ele fala. – Prazer, meu nome é ------, mas pode me chamar de Panda. Ótimo, Panda, porque não entendemos seu nome.

Os chineses usam bolsa de mulher. Mas quem disse que é de mulher?

Faz uma semana que estamos em Beijing e a conclusão é que eles podem até ser fechados. Mas são menos sérios que eu poderia imaginar. Eles sorriem muito no contato com você. Não entendem uma palavra do que você fala. E vice-versa.
- English? Pergunto.
- (cara de espanto).
- English? No? - Tento de novo.
- Anglis no hahahahaha. Remendou-me a vendedora do Carrefour. Ela ria de um lado e eu de outro.

Mas funciona, simpatia é quase amor.

Outra vez, sentei sozinha no restaurante para almoçar e vi no menu algo que era pato, pedi o pato. A moça me mostrou um pato inteiro, entendi que ela queria dizer que era muito só para mim. Disse então que não. NÃO, gestos e mais gestos dizendo que eu não queria mais o pato. E pedi outra coisa que achei que era só macarrão e outra coisinha para completar. Veio o pato, o macarrão completo e a outra coisinha. Comida para três. E comi muito para não fazer desfeita. E ri. Porque esse é o aprendizado.

Ontem pedimos um prato e chegou outro. Entreolhamo-nos e pensamos: Quem vai reclamar e dizer que não era isso? Resultado: botamos pra dentro. Sorte que era bom!

Gostaria muito de entrar na rotina deles e fazer parte de tudo isso. Mas é impossível. Os velhinhos e as crianças me encaram como se eu fosse um alien ruivo. Os adultos disfarçam. E os jovens gritam: Hallo!! Acho que não conseguirei integração total.

E assim passamos esta primeira semana na China. Sorrindo, indo dormir meio-dia para acordar pro Jornal Nacional, tentando entrar no fuso, fazendo xixi de cócoras e tomando sopa de macarrão no café da manhã.

Tem outras coisas. Muitas, claro. Mas são outras histórias.


quarta-feira, 6 de abril de 2016

Cola a boca!

Queria dizer o que penso
Palavras não adiantarão
Para calar minha boca
Comprei uma cola de bastão
Que vou usar de batom
E te dar um beijo apertado
não abro mais minha boca
Mas VOCÊ também fica calado
Se não adiantar fico louca
Tento cola de sapateiro
cola couro, cola boca
cala a boca, cala a boca!
Se falar não adianta
Não vou fazer nenhum som
Prefiro passar "batom"
E para ninguém conversar
Me escondo e você se esconde
Vou tomar cascolar!
Se ainda não adiantar
Vai ter que ser superbonder!

(em 2000)


quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

15 anos sem mamãe

15 anos.

Faz-me lembrar você e nossas festas... Semanas antes e todos os quitutes feitos em casa, a mesa enorme da sala cheia de confeitos, forminhas coloridas e as novidades que você buscava só para fazer algo diferente. O cheiro na casa mudava, ficava suavemente doce, assim como suas intenções de celebrar que as filhas estavam ficando mocinhas.

Lembro do apartamento do Rovigo cheio na festa da Liz, tal qual coração de mãe, que abraçava com amor e delícias cada convidado que chegava. E a sala diminuía: "Mas não podia deixar de convidá-lo (a)!" Falava você com seu brilho sapeca nos olhos, tentando se justificar para que o pai não brigasse com você.

Lembro do dia em que a Liz me tirou do estágio no Sagrado para que a Tia Rose me entregasse aquele vestido azul lindo de princesa e quando abri a caixa você desmaiou, tamanha emoção! Mas é porque VOCÊ merecia, não eu. E do meu "bolo-novidade" da época, uma caixa linda de madeira toda enfeitada, com pedaços de um delicioso bolo de laranja, que você fez com todo amor do mundo, enrolados em papel alumínio. "As pessoas quase não comem bolo, então já fica bom para levar pra casa!" Você dizia com sua voz sofrida, levantando quase toda sua força numa crise renal fortíssima que te consumiu, inclusive no dia da festa. Mas adiar nem pensar, tudo pronto e lindo para debutar a filha caçula, agora também uma moça.

E 15 anos se passaram desde que você partiu. Hoje não queremos celebrar. Nossa vontade é de chorar, gritar, enlouquecer, tamanha a falta que você nos faz. Assim como a criança que teima em querer se tornar adulta logo, achávamos que a dor se acalmaria com o passar do tempo. E assim como essa criança se torna adulta e encara as agruras das responsabilidades da vida, deseja voltar a sorrir e brincar como um bebê inocente, nós gostaríamos de voltar no tempo e ter você mais uma vez em nossos braços. Mas não é possível. Então, faremos como você, que tirava forças não sei de onde - e sempre - e hoje comemoramos nossa vida. Boa, justa, saudável, do jeito que você nos ensinou. Celebramos você e tudo que você nos deixou e que continua firme dentro de nós, pequenos pedaços da sua grandeza. Celebramos nosso amor incondicional, nós três que ficamos aqui, tentando sempre te orgulhar e não desistir.

A saudade cresceu, virou moça e a despeito da vontade da rebeldia adolescente, escolhemos que ela se tornasse madura. Escolhemos viver os sonhos que você não realizou e são eles que nos apoiam e nos fortalecem a cada dia dessa vida sem você.